Parece que Pequena Miss Sunshine inaugurou, no ano passado, a era das comédias independentes no Oscar. 2008 é a vez de Juno, um filme que, apesar de possuir um carisma inquestionável, deixa a desejar se comparado com as aventuras da família de losers.
Dirigido por Jason Reitman, do ácido e politicamente incorreto Obrigado por fumar, Juno é mais uma crítica à hipocrisia da sociedade americana - ou, por que não, da sociedade ocidental como um todo. Com uma abordagem leve e nada descompromissada, Reitman faz um passeio por temas como gravidez na adolescência, aborto, maturidade e amor. Tudo isso pelos olhos da jovem Juno, interpretada por Ellen Page, que aos 16 anos engravida de um colega de colégio e precisa decidir como lidar com a nova descoberta.
Logo na introdução do filme percebemos que não se tratará de uma daquelas histórias bobinhas sobre relacionamentos na adolescência, com jovens estereotipados, festas e final feliz. Juno é estranha. E autêntica demais. Por isso, quando descobre que está grávida (após fazer TRÊS testes de gravidez), ela não decide casar, não decide criar a criança com ajuda dos pais e muito menos abortar. Ela simplesmente tem a idéia de DOAR o bebê para um casal que achou nos classificados do jornal, ao lado de anúcios de pássaros raros. Assim, muito conscientemente e com motivos bem fundamentados.
A partir daí, acompanhamos a gravidez da menina, seus conflitos com as mudanças do corpo, sua relação com o pai do bebê e com os futuros pais da criança, um casal milionário que... digamos assim... não está bem afinado nos planos pro futuro.
Apesar das quatro indicações para o Oscar (melhor filme, direção, roteiro original e atriz para Ellen Page), Juno não é nenhuma obra prima. Mas tem quatro pontos decisivos para ser um filme que valha (e muito) a pena ver até sem a carteirinha de estudante.
1. O longa não tem julgamentos morais. Nada de "devia ter usado camisinha" ou "isso que dá ser sexualmente ativa tão cedo". Pelo contrário. Apesar de tomar uma decisão no mínimo inusitada e contra os instintos naturais de maternidade femininos, Juno continua sendo uma menina carismática demais. A frieza dela não causa repulsa em nenhum momento. Ponto pro diretor, não deve ter sido nada fácil encontrar o meio termo entre a inconseqüência natural da juventude e a falta de humanidade.
2. A atuação de Ellen Paga realmente é um primor. A personagem carrega uma certa apatia e desprezo pela humanidade e suas convenções que a atriz consegue transmitir com sucesso. Frases como "estava resolvendo um problema que está bem além do meu nível de maturidade" demonstram uma ironia afiada que é sempre bem-vinda.
3. A trilha sonora. Com músicas de The Velvet Underground, Cat Power e Belle & Sebastian, é impossível não sair do cinema empolgado pra baixar toda a trilha sonora.
4. O desfecho é absolutamente natural, assim como é a vida. Nada de grandes tragédias, nada de felicidade eterna. Tudo assim, como tem que ser, normal. Inclusive com uma música bem "nada de mais".
E vale também prestar atenção na forma que Reitman trata o aborto, mostrando a banalização dessa prática nos Estados Unidos. Há uma espécie de ONG na qual com uma simples ligação se consegue um aborto de graça e sem maiores explicações. A clínica e a atendente são bizarras. Além disso, nenhum dos personagens deixou de cogitar o aborto como uma alternativa. Nem a própria Juno.
Antes que eu me esqueça: o filme é engraçadíssimo, ok?